Eletrolivros, cachorros e linguiças ou “e-book caindo n’alma é germe que faz a palma”

Caros colegas,

Qual não foi minha surpresa quando, ao olhar as estatísticas do blogue, me deparei com o fato de que o livro A língua portuguesa no Brasil, que coloquei à disposição no penúltimo post, já foi baixado mais de 240 vezes desde a última semana.

Há não muito tempo, assistia a uma entrevista com um crítico francês que deplorava o e-book e falava sobre o quanto o mundo vai se emburrecer quando não mais existirem livros em papel. Venho humildemente dizer que não partilho da opinião do citado senhor. Não se pode, e nem se deve, confundir continente com conteúdo. Os contos de O. Henry, os poemas de Mário Quintana, os quadrinhos de Milton Caniff e os artigos de J. L. Austin não são belos por estarem impressos em papel. Eles são belos porque possuem esta capacidade quase mágica de nos encantar, maravilhar, e, às vezes, fazer brilhar em nossos olhos um pouquinho da centelha que certamente um dia luziu na retina destes autores.

Sim, meus colegas, os nossos antepassados que viveram antes de Gutenberg e antes dos códices nada perderam por lerem em pergaminhos, manuscritos ou sutras. Aqueles que viverem depois de nós nada perderão simplesmente por lerem os textos em telas, tablets ou em hologramas. Quem sobreviverá será a palavra escrita.

Obviamente, sempre haverá aqueles que estão convencidos que o mundo está cada vez pior, que a arte está cada vez mais vituperiosa e que os jovens estão cada vez mais boçais. Eles sempre nos contarão que em suas épocas tudo era melhor, as pessoas eram mais honestas e cultas e havia um certo censo de inocência e amizade em todas as relações. Eles apenas se esquecem que antes deles também pensavam assim os seus pais e os avós de seus pais e os tataravós dos bisavós de seus trisavós. Sempre houve no mundo o grotesco, mas é simplesmente por isso que sempre houve no mundo o maravilhoso.

Graças a essas novas tecnologias, um livro esgotado há quase um século pôde novamente ser lido e descoberto. Será que é preciso mais algo para mostrar que e-book não é um demônio?

Certezas, eu as tenho muito poucas na vida, mas uma é, para mim, mais do que certa: nunca, jamais, (mas nunca mesmo!) se amarrou cachorro com linguiça; nem mesmo na época que a linguiça ainda se escrevia com trema.

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